Resenha: Exuberância Irracional, de Robert Shiller

Introdução

O termo Exuberância Irracional se tornou popular após o discurso do antigo chairman do FED (banco central americano), Alan Greenspan, em 1996, ao descrever o comportamento do mercado de ações na época. O discurso sucedeu dois dias após a apresentação de Robert Shiller para toda a diretoria do Federal Reserve acerca de suas investigações sobre o mercado e a precificação exagerada dos ativos.

Como o autor descreve em seu livro, a exuberância irracional é a base psicológica para uma bolha especulativa. A bolha é definida como um cenário onde o aumento dos preços estimula o entusiasmo dos investidores, espalha-se pela psicologia do contágio, de pessoa para pessoa, a ponto de atrair uma nova classe de investidores, parte pela inveja do sucesso dos outros e em parte pelo entusiasmo dos participantes do mercado.

Quem é Robert J. Shiller?

Americano, pesquisador, Ph. D pelo MIT e professor universitário, Robert Shiller foi coroado com o Prêmio Nobel de Economia em 2013. Autor de diversos artigos e livros, sua obra de maior destaque é a o livro Exuberância Irracional, lançado pouco antes da bolha da internet de 2000 no mercado acionário, que após seu estouro, levou 12 anos para o os preços se recuperarem. Seu livro possui ensinamentos valiosos até os dias de hoje. Por ser um conteúdo denso e extenso, há pouco material disponível para os investidores interessados – especialmente em português – portanto disfrute e aproveite ao máximo desta leitura.

Exuberância Irracional

O livro inicia com um exame da valoração histórica dos mercados, tratando dos inúmeros períodos de bonança e crises pelas quais a sociedade já passou. A análise dos mercados compara a evolução dos preços dos índices acionários em confronto ao crescimento do PIB, lucros corporativos e renda das famílias.

Dentre vários indicadores utilizados para inspeção do mercado, o mais conhecido e citado é o Shiller PE Ratio (ou CAPE Shiller). Sua fórmula utiliza o preço sobre o lucro, mas considera a média do lucro dos últimos 10 anos, suavizando as oscilações de curto prazo. Os achados de Shiller revelam a relação entre este indicador, que mede o valuation das ações, e o comportamento apresentado pelo mercado nos anos seguintes. Busca-se estimar a expectativa de retorno futuro baseado nos níveis atuais de preço do mercado.

Gráfico extraído do capítulo 1.
Cada número plotado espelha um ano diferente: “19” é 1919, “46” é 1946 e assim por diante.

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Eixo vertical representa o retorno real anualizado dos próximos 10 anos.
Eixo horizontal representa o indicador CAPE Shiller PE

Repare nos anos onde os preços dos ativos foram inflados, como foi em 1929, e o retorno realizado dos próximos 10 anos. Ter adotado uma postura de buy and hold nestes casos levou o investidor a um retorno pífio e até negativo por muitos anos.

O que explica o mercado?

Se o crescimento da economia e dos lucros corporativos não eram suficientes para explicar o incremento dos preços das ações, Shiller se questionou quais outros motivos levariam a este notável movimento de alta na última década do século passado – entre 1992 a 2000. Dentre as causas adjacentes estavam: surgimento e crescimento da internetredução da carga tributária conduzida pelos republicanos; aumento da população economicamente ativa fruto da alta taxa de natalidade após a 2º guerra mundial;  fortalecimento de uma cultura materialista; e o aumento da familiaridade com o mercado de ações após a criação dos planos de previdência 401k, difusão dos fundos mútuos e a aparição da mídia especializada em negócios como a Bloomberg e CNN. Todos motivos são plausíveis, mas insuficientes para justificar os preços do mercado.

A bolha especulativa é descrita como o resultado de um círculo vicioso de confiança e expectativa futura balizadas pelos retornos passados, seduzindo novos investidores, levando os preços a patamares ainda mais altos. No final da década de 90, o autor coletou dados com questionários respondidos pelos investidores e, para se ter uma ideia dos resultados, 96% dos respondentes afirmaram que as ações eram o melhor investimento para o longo prazo. Ainda que você concorde com esta afirmação, é estarrecedor a predominância do otimismo com as ações. Em um mercado com imóveis, ouro, renda fixa, commodities e artigos de luxo, seria razoável presumir que um percentual maior de pessoas tivesse preferência por outros ativos também.

O autor reforça o papel da mídia como uma das grandes responsáveis por alimentar o loop que prende a atenção dos investidores nas ações, sempre com novidades de produtos e histórias de sucesso instigando as pessoas. No Brasil, o economista Richard Rytenband foi pioneiro em analisar as capas de revistas como indicador de sentimento do mercado, sinalizando a força e o papel que a mídia especializada e tradicional permanece tendo na análise dos ciclos econômicos.

No final do livro a discussão se direciona às teorias que tentam explicar a formação dos preços dos ativos. Uma das teorias mais importantes e ainda debatida no meio acadêmico é a Hipótese do Mercado Eficiente. Segundo ela, os preços do mercado incorporam toda as informações existentes, portanto, por esta perspectiva, não existem ações nem mercados caros ou baratos.

Shiller discorda totalmente da teoria acima e relembra o leitor de momentos onde a irracionalidade tomou conta e os ativos não foram precificados corretamente, como foi na Bolha das Tulipas e casos de empresas, como a eToy que faturava U$ 30 milhões por ano, apresentava prejuízo e era avaliada bem U$ 8 bilhões.

Conclusão

Ignorar os riscos envolvidos em um mercado irracional, com os preços em patamares injustificáveis é um perigo que o investidor deve ter em mente. Para um iniciante ou observador externo, pode parecer que o mercado de ações simplesmente voltará para onde estava antes de um crash, mas isso nem sempre é verdade.

Mercados em correção de preço são acompanhados, geralmente, por períodos de fraqueza e agitação na economia, portanto além da perda financeira, é de se esperar o aumento do desemprego e a queda de renda, levando pessoas ao desespero.

O grande desafio está no fato de não conseguirmos prever quando uma bolha especulativa irá estourar, mas podemos nos preparar, reduzindo nossas posições em ações (ou outro ativo) e não ignorando o princípio da diversificação de carteira.

Por que você deveria ler esse livro?

Apesar de possuir um conteúdo vasto, o livro não é sobre valuation e não apresenta uma linguagem técnica que impossibilita o investir de compreendê-lo.

O livro pode ser considerado uma importante bibliografia para o estudo das finanças comportamentais, visto que abrilhantou a discussão sobre o processo de investimento e aprofundou a análise sobre como traços culturais e psicológicos contribuem para tomada de decisão irracional.  Shiller identificou 12 fatores estruturais responsáveis pelos excessos especulativos e apresentou soluções para evitar futuras bolhas especulativas.

Se o seu objetivo é aprender a interpretar os ciclos econômicos e se proteger da euforia que, eventualmente, se espalha pelo mercado, esta será uma ótima leitura. Se você ainda não tem certeza se vale a pena, é só lembrar que pouco depois da a publicação do livro, o índice acionário da Nasdaq caiu +80% e na 2º edição do livro, publicada anos depois, Shiller também alertou sobre os excessos do setor imobiliário que foram revelados em 2008.

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